quarta-feira, 11 de julho de 2012

Heróis inevitáveis


Essa semana os jornais noticiaram com ênfase a devolução de vinte mil e uns trocados achados na via pública por um casal de moradores de rua. Rejaniel e Sandra encontraram uma sacola deixada por bandidos que tinham acabado de assaltar um restaurante e chamaram a polícia. Motivo da notícia: eles não ficaram com o dinheiro!

Isso: ser honesto hoje em dia é uma notícia sensacional. O que não é mais notícia é ser ladrão. Isso é normal. E o assunto é reverberado como se qualquer um de nós ficaria com a grana. Devolver é ser otário, doente ou herói fora de época. E isso é muito triste na propagação dos valores de uma sociedade.

Ninguém parece ter ouvido as razões de Rejaniel para a devolução do dinheiro: são moradores de rua, nada possuem. Gastassem o dinheiro seriam presos como ladrões. Os colegas de infortúnio botariam olho grande e aí eles teriam um enfrentamento com seus pares. Ninguém ia vender qualquer coisa pra quem não tem nada. Portanto o dinheiro não tinha qualquer serventia na mão de excluídos urbanos. Eram obrigados a devolver. Agora sim, podem estar bem vestidos, ele barbeado e ela maquiada, pelas televisões que devem transmitir a façanha de heróis.

Eles não podem ser pessoas como nós que ficaríamos com o dinheiro que não era nosso, atendendo a ética da sociedade moderna. Mofariam numa prisão por terem roubado o restaurante, como cúmplices, ou apropriadores indébitos de terceiros. Pena agravada por sua situação de vagabundos e excluídos da sociedade.

Rejaniel e Sandra foram expertos ao assumirem o papel de heróis. Serão incluídos no sistema por alguns dias, ou escaparão das amarras da exclusão, quem sabe?

Isso também é muito triste para os valores de uma sociedade que convive com esta perversão. Políticas públicas para os excluídos não mudariam o rumo de vidas náufragas? Isso é que a notícia mostra nas entrelinhas e não queremos ver.

(Edmar Oliveira)

2 comentários:

Izabel Fialho disse...

Não são Ets não gente, claro, também não são políticos. São os "Excluídos Urbanos". Pessoas que muitas vezes as pessoas fecham os vidros do carro pq tem medo. Tenho medo dos políticos.
Abraços.

Letras e letteras disse...

Dias de infortúnios a quem foi perdendo o direito à cidadania, garantia constitucional, porque os negócios de governos e seus lobistas e empreiteiros, marketeiros e cascateiros e cachoeiros consomem todo o tempo oficial de tratar de assuntos de governos. Políticas públicas de atenção ao cidadão comum, meio engodo, meio engana que eu gosto. quanto aos excluídos urbanos, nem heróis, nem "bons" mocinhos,só invisíveis. em terra de ladrões, ser mocinho parece defeito, que lambido, quando conveniente.